quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Análise das eleições 2010

As eleições 2010 certamente viraram um marco na História do Brasil. Isso porque, depois da redemocratização do país na década de 1980, da promulgação da Constituição Federal em 1988 e da primeira eleição direta para Presidente da República em 1989, o país viveu seu momento mais intenso de democracia. Sem falar, ainda, do marco histórico da condução da primeira mulher à Presidência da República.

Assistimos, nesta eleição, a fenômenos surpreendentes que mostraram o quanto o Brasil avançou em termos de Democracia, mas também o que precisa ser melhorado, amadurecido, no sistema democrático brasileiro. E, convenhamos, muita coisa precisa ser repensada. A Constituição de 1988, que instituiu o regime democrático no Brasil, ficou conhecida por Constituição Cidadã após Ulysses Guimarães promulga-la em meio a centenas de congressistas eufóricos .A cena diversas vezes reproduzida que mostra os constituintes brasileiros cantando o Hino Nacional, é de emocionar até o menos patriota dos cidadãos. O dia era 5 de outubro de 1988, e os brasileiros, depois de 24 anos de Regime Militar, viam sua democracia aberta novamente. Entretanto, os primeiros anos da fase democrática do Brasil foram conturbados.

João Baptista Figueiredo, último presidente militar, disse que a transição do Brasil para um governo democrático seria “lenta e gradativa”. Na época, Figueiredo ainda gozava do prestígio econômico conquistado no Governo Médici, onde o milagre econômico colocara o Brasil entre as 5 economias mais desenvolvidas do mundo. O país, de norte a sul, era um verdadeiro canteiro de obras; entretanto, para isso, os militares não levaram em conta a distribuição de renda e os avanços sociais. Anos mais tarde, a política econômica estaria desgastada pelo seu uso irresponsável, e o Brasil viveria época de hiperinflação.

Mas, o que tudo isso tem a ver com as eleições 2010?

O ponto chave é a compreensão da transição do regime ditatorial para o regime democrático. Tudo que ocorreu nessas eleições é melhor compreendido se analisarmos aquele momento. Não é à toa que os dois principais candidatos à presidência, Dilma Rousseff e José Serra, utilizaram-se muito de argumentos vindos da época da ditadura. Vejamos.

José Serra foi líder estudantil e, pouco antes do golpe, discutia com o então Presidente João Goulart as reformas de base no Brasil. Estas reformas, juntamente com o grande Comício da Central do Brasil, foram determinantes para o golpe. Quando os militares tomaram o poder, Jango foi para o Uruguai e Serra para o Chile. Depois de muitas idas e vindas, Serra chegou ao Brasil e, beneficiado pela lei da anistia, entrou na política. Foi constituinte e coordenador de campanha de Tancredo Neves, do PMDB.

O que Serra esqueceu, entretanto, é que seu partido, o PSDB, é dissidente do MDB, constituindo-se em um partido de Centro-Esquerda. Seria um “PT Elitista”, por assim dizer. Mas há de se observar as coligações. E nesse quesito, José Serra caía em contradição. Alegava ser um ferrenho opositor ao regime militar, mas mantinha em sua base aliada o DEM (Partido dos Democratas), derivado do PFL (Partido da Frente Liberal), que compôs a base de sustentação da ditadura.

Já Dilma Rousseff teve um papel de luta mais campal contra a ditadura. Foi às ruas, participou de grupos revolucionários, foi presa e torturada. Entretanto, Dilma não esteve presente com destaque na redemocratização do Brasil. Tampouco esteve ela na Constituição de 1988. Dilma surgiu na política quando, junto com seu ex-marido, ajudou a fundar e consolidar o PDT (Partido Democrático Trabalhista), o mesmo de Leonel Brizola. Dentro do PDT, Dilma conquistou seus primeiros cargos políticos, sendo a primeira Secretária de Finanças de Porto Alegre na gestão de Alceu Collares, afilhado político de Brizola. Sua chegada ao PT deu-se em 2000, quando o governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, do mesmo partido, a nomeou Secretária de Minas e Energia.

Mais do que um embate Serra x Dilma, e eleição 2010 produziu um fenômeno sociológico jamais visto no Brasil. Em nenhuma outra eleição houve tanta polarização. Eleitores do PT e do PSDB ganharam contornos próprios, bem definidos, e facilmente diferenciados.

O voto em Dilma Rousseff, em sua grande parte, deveu-se a Lula. O voto de José Serra deveu-se a ele mesmo. Mas não era para ser assim. O que estava em jogo, em disputa, eram dois projetos de governo completamente distintos e cabia ao eleitor analisa-los. Entretanto, isso não foi levado em consideração pela maior parte da população, que votou por critérios diversos.

A diferença nos projetos de governo é evidente. O governo do PT, conduzido durante 8 anos por Lula, é reconhecidamente de olhar mais social, de prestígio internacional e de forte nacionalismo. Já o governo do PSDB é reconhecidamente um governo mais técnico, menos humano, e com um olhar mais econômico. Isso torna o partido escravo de uma Tecnocracia sem limites.

O resultado, portanto, confirma que o povo brasileiro acreditou na “desconhecida” Dilma. Elegeu, com confiança, uma mulher para presidir o Brasil. Não quis apostar no modelo de governo do PSDB outra vez.

Dilma chegará ao governo em condições extraordinárias. Terá maioria na Câmara, no Senado, Economia Estável, pessoas competentes na sua equipe, e prestígio internacional. Cabe a Dilma, agora, não só dar continuidade aos avanços de Lula e consertar aquilo que está errado, mas também reacender no Brasil a chama democrática, para que o povo não se sinta cidadão apenas de 4 em 4 anos.

Um comentário:

Charlie Fonseca disse...
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