segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Quem não é da universidade pública está na privada?

Desculpem-me pelo trocadilho nada engraçado no título. Mas é porque este trocadilho pode nos servir de pontapé inicial para toda a nossa discussão aqui neste artigo.

Esta discussão foi suscitada hoje durante o debate numa aula do curso de Direito numa Universidade Particular em Aracaju. As academias jurídicas sempre são um importante centro de debates, ideias, confrontos sadios e reflexões filosóficas, políticas e sociológicas. A pena é que, cada vez mais, os alunos necessitam de uma provocação para que expressem sua opinião e iniciem o debate. E assim foi.

Tratou-se muito da Universidade Pública, mais de perto da Universidade Federal de Sergipe, em oposição às universidades particulares. Falou-se que a UFS aprovava mais alunos na OAB, proporcionalmente, que as outras academias sergipanas. Citou-se também a questão dos alunos da UFS serem melhores que os demais. Foi aí, bem aí mesmo, que pisaram no meu calo.

Confesso que quando estudante dos níveis básicos, Ensino Fundamental e Ensino Médio, tive pensamentos semelhantes e até mais fortes: Não valorizava alunos de universidades particulares, e os imaginava incompetentes por não passarem numa universidade pública. Tudo besteira. Estes pensamentos nada condizentes com a realidade me eram impostos pela escola. Sempre vi revisões, dedicação, informações, atendimento, para aqueles que pretendiam ingressar numa universidade pública. A particular ficaria em segundo plano. Tudo isso desperta uma cultura discriminatória: Passou na UFS e lá estuda é bom; passou na Unit, FaSe, Facar, Faser, Fama, etc., é medíocre, sem méritos. Grande parte da cultura aracajuana a isso se resume.

O bom é que este que vos escreve pode expressar uma opinião vista sob as duas óticas, sob a ótica de alguém que conhece, na prática, a rotina de duas universidades: Uma pública, e uma particular. Decerto que a universidade pública tem mais mestres e doutores em seu corpo docente, por exigência feita no ingresso por Concurso Público. Decerto que ela também possui uma seleção mais rígida. Decerto que ela também já pega o aluno apto, vindo do Ensino Médio com boas médias e boa capacidade de absorção de conteúdo. Mas, isso faz dos estudantes das universidades privadas medíocres, inúteis e sem méritos? Evidente que não.

Quando aluno da UFS, vi lá dentro um mundo. Todos os tipos de pessoas. Na UFS, você aprende a crescer, aprende a levar a vida por si só, a ser independente. Se você é aluno do curso de Direito na UFS, você pode ter a oportunidade de, por exemplo, estudar na mesma sala que alunos de Física ou Medicina. Isso aumenta, e muito, a sua vivência universitária. Por um processo mais rigoroso de seleção, principalmente nos cursos de humanas, os alunos, presume-se, são mais aptos ao debate inteligente, sadio e de idéias. Mas também vi por lá outra realidade.

Convivi com professores que faltavam às aulas de forma frequente, prejudicando a grade. Convivi com alunos que estavam na universidade pela 30ª vez (Ressaltando aqui a hipérbole) apenas por interesses políticos. Convivi com alunos que simplesmente me diziam: “Estou na UFS por status”. E é isso: A UFS dá, acima de tudo, status. Os empregadores, ao analisarem um currículo, olham com bons olhos se o aluno for graduado na UFS.

Mas, e daí, os alunos das universidades privadas estão “na privada”? As universidades particulares são reconhecidamente mais organizadas, assemelhando-se até a uma escola de Ensino Médio. No caso de Sergipe, há de se elogiar a organização da Universidade Tiradentes, a sua estrutura excelente, a biblioteca com milhares de títulos novos e atualizados para consulta e empréstimo (Aqui nem preciso comentar sobre o estado dos livros da BICEN-UFS).O problema todo reside no ingresso: Muitos alunos ingressam na Unit, e é reconhecidamente mais “fácil” passar nesta do que na UFS. O número de ingressantes em cursos como Direito na Unit é quatro vezes maior do que na UFS. Por ano, a Universidade Federal de Sergipe aceita 50 alunos por turno no curso de Direito. Por ano, no mesmo curso, a Unit aceita 400 por turno.

Quando vamos às estatísticas, analisamos os números relativos, e não os absolutos. “UFS aprova 85% dos alunos de Direito na OAB.” – Dos 100 ingressantes na UFS, se todos prestarem o exame, 85% corresponde a 85 aprovados. Se a Unit quiser manter este percentual, dos seus 800 alunos ingressantes num ano, 680 deveriam ser aprovados no exame. Mas o percentual é bem menor.

O que ocorre? Proporcionalmente, e apenas proporcionalmente, a UFS lança mais advogados no mercado. Absolutamente, e apenas absolutamente, a Unit sai na frente.

As universidades privadas são assim discriminadas pela facilidade no ingresso, quando comparado às públicas. Assim, num universo onde a “filtragem” é baixa, torna-se mais fácil encontrar alunos ruins. Mas há alunos bons nas universidades particulares. Melhores que alunos da pública.

3 comentários:

Jones Ribeiro disse...

caro Felipe,
Em primeiro lugar quero lhe parabenizar pela qualidade do texto, muito bem redigido e muito bem argumentado. Creio que o nosso objetivo foi atingido, fizemos com que os alunos reflitam um pouco sobre esssa realidade. Quanto a minha opinião, creio que deve ter ficado bem clara: penso da mesma forma que você, tanto que preferi abordar questões como o número de aulas seguidas e provas por períodos, dentre outras coisas que não deu tempo de serem citadas; penso que a questão maior na avaliação ruim da UNIT reside sim no número de alunos, mas sei que esta é uma questão imutável, até mesmo por fins econômicos; a questão toda é maximizar ainda mais aquilo que a instituição tem de bom, reconhecendo seus erros e absorvendo virtudes que porventura tenham outras Universidades. É isso, um abraço e acompanharei a partir de agora seu blog!

Candido Vieira disse...

Luis Felipe,

Excelente colocação. Me sinto feliz em ter participado do grupo que suscitou a discussão. Fico especialmente feliz por ver a repercussão da nossa proposta, pois sabemos que não é comum a participação de um elevado número de alunos em discussões em aula. Entrando no mérito do seu texto, assim como você, quatro dos cinco integrantes do grupo já estudaram na UFS, e mais, todos fomos também alunos de escolas públicas no ensino médio, portanto conhecemos a realidade dessas instituições. Minha posição pessoal é a rejeição da ideia que alunos das instituições públicas sejam melhores que os das instituições privadas. Para reforçar meu argumento levantarei alguns pontos que, apesar de não ter embasamento científico, tem embasamento empírico, no caso, meu mesmo: 1) muitos alunos das instituições privadas também estudam na instituição pública. 2) muitos alunos saíram de instituições públicas em busca de melhor estrutura e organização encontrando ambas nas instituições privadas (meu caso particular). 3) não é admissível considerar a instituição como parâmetro para auferir competência sem considerar o individuo.
Essas três constatações me levam a concluir que é muito difícil poder diferenciar alunos de uma ou outra instituição, não sendo possível então saber quem é melhor do que quem. No entanto é notável na comunidade o papel de “aluno de segunda classe” imposto a alunos de universidades/faculdades particulares frente aos alunos das públicas. Para mim esse 'desprezo' reforça a expressão latina “À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta”. Com o atual contexto de 'discriminação' não basta que os alunos das particulares sejam bons, eles também tem que parecer bons e para isso, em minha opinião, precisamos demonstrar em concursos, congressos, eventos, trabalhos acadêmicos, provas, competições, o quão bons podemos ser. Entretanto não admito que a NOSSA parcela de responsabilidade seja transferida para as universidades. Cada individuo é o principal responsável por sua própria formação. Não adianta ter universidade excelente se o aluno não a frequenta para estudar. Só me entristece (e ao mesmo tempo me estimula) o fato de que essa discussão sobre a qualidade da nossa formação ficar relegado a debates curtos em sala de aula. Acredito que esse é um papel fundamental de um Centro Acadêmico forte, que não se submeta a interesses diversos dos estudantes, e ajude a construir uma Instituição de Ensino Superior superior. Infelizmente não me parece ser uma das preocupações dos nossos representantes atuais, mas essa discussão fica para um outro comentário/post... Abraço e até a próxima.

Anônimo disse...

Sério? Wu li isso? Vc viu o ranking das universidades que o MEC divulgou em 2010? A Unit é a pior universidade do nordeste, na classificação.